terça-feira, 27 de março de 2007

Por dentro da Apple - Parte 4

BIOSFERA TECNOLÓGICA
Há um aspecto pouco mencionado que ajuda a entender a máquina de invenções da Apple. Diz respeito ao ambiente que a circunda. O Vale do Silício começou a atrair empresas de tecnologia como a Hewlett-Packard desde a década de 50 do século passado. Ali reside há décadas um manancial de conhecimento que não é exclusivo de uma ou outra marca, mas do qual todas se alimentam. Os profissionais circulam entre grandes companhias e pequenos empreendimentos tocados por eles mesmos. A cultura de inovação é forte e vem de mãos dadas com uma agressiva cultura de negócios. Não é por outro motivo que empresas como Google, Oracle e Intel nasceram e prosperaram naquela região. O projeto iPod deixa isso claro. Ele começou no final de 1999, e não teria decolado se não fossem as pessoas de fora da Apple. O embrião do programa iTunes foi comprado em junho de 2000 de uma empresa chamada Sound Step, fundada por um ex-funcionário da Apple. Para comandar o desenvolvimento de hardware do projeto, a Apple foi buscar Tony Faddel, um engenheiro freelance que já havia passado por várias empresas do Vale e deixado fama de ser tão incontrolável quanto brilhante. Na Apple ele encontrou um lar. A Faddel juntou-se o pessoal da Portal Player, uma empresa recém-fundada que vinha trabalhando duro para melhorar os primeiros tocadores de música de MP3. Ela possuía não somente o know-how de projetar esse tipo de aparelho como conhecia os fornecedores asiáticos de componentes que poderiam lhe dar forma. O último elemento do time foi acrescentado com a Pixo, dona de um programa capaz de fazer funcionar suavemente o hardware que a Portal Player já vinha projetando. Sem esses forasteiros, a Apple não teria conseguido desenhar o iPod no exíguo prazo de seis meses, e nos padrões de excelência exigidos por Jobs. Assim como as companhias asiáticas se beneficiam da biosfera tecnológica que abriga a melhor fabricação eletrônica do mundo, a Apple bebe de uma fonte profunda de inovação que veio antes dela e a circunda – o Vale do Silício.

Garoto de ouro da mídia: desde que se lançou ao mundo dos negócios, com 21 anos, Steve Jobs já esteve 68 vezes em capas de revistas (69, com essa edição). Os altos e baixos de sua carreira hipnotizam o mundo empresarial

No livro The Perfect Thing (A Coisa Perfeita), de Steve Levy – cujo primeiro capítulo é reproduzido nesta edição – um dos integrantes da equipe de 40 pessoas que criou o iPod dá sua versão de como funciona o processo criativo da Apple. “Nós trabalhávamos muitas horas, mas estávamos no mesmo barco, com muita energia. Era um time incrível e não havia fronteiras. Os caras do software, os caras do hardware, todo mundo junto. Foi uma experiência fascinante”, afirma Jeff Robin. Será esse tipo de experiência replicável? Observadores externos à Apple duvidam. Dizem que o sistema só funciona porque está limitado a um número pequeno de projetos. Os produtos podem ser pajeados em tempo integral, do berço ao balcão, por uma equipe pequena e dedicada de desenvolvedores. Esse modelo não permite crescer e não se ajustaria em corporações como Samsung e Sony, compelidas a inovar em um arco muito mais amplo de produtos. Talvez seja verdade, talvez não. A idéia de concentrar esforços e buscar excelência de forma intransigente parece aplicável a qualquer negócio. Assim como a máxima de Jobs sobre a missão de sua empresa. “Atuamos apenas em áreas onde sentimos que podemos fazer uma grande contribuição”, afirma. “Temos de dizer não a milhares de idéias para não tentar fazer coisas demais.” Se isso denota pouca ambição no empresário menos modesto do mundo, ele arremata: “Não vamos ser os caras mais ricos do cemitério, mas somos os melhores no que fazemos”.

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